Pensar a columbofilia |
29/06/2015 |
Pensar a Columbofilia
José F. Coxo- Arraiolos
Nesta segunda “aparição” neste jornal depois de alguns anos de paragem “ forçada” imposta a mim próprio mas, não por falta de temas ou de pensamentos columbófilos ou de afastamento desportivo, tinha em mente trazer a estas páginas diversos temas que se prendem com este desporto que pratico, com muito gosto, desde 1968. Temas estes que enquadro em “ pensamentos” porque, quer queiramos ou não temos sempre de nos preocupar com a realidade á qual pertencemos.
É certo que normalmente neste país nunca tivemos na génese e nas nossas ascendências o pensar atempadamente, o planificar em tempo certo, o programar, o prever, o definir objectivos, em suma sempre, nos pautámos por actuar com factos já confirmados e normalmente muito depois das “carruagens” já estarem em andamento “. Vidé em termos históricos ( revolução industrial, manutenção dos territórios coloniais contra ventos e tempestades, obras públicas adiadas eternamente, e muitos outros factores) .Quantas e quantas vezes fomos ultrapassados por outros mais meticulosos e mais projectistas. Tivemos sempre e ainda temos uma componente forte do “desenrasque “ que muitas vezes até a nós nos surpreende. Na columbofilia reflecte-se todo este conjunto de posturas.
É certo e sempre o tenho dito, qualquer comentário , qualquer pensamento escrito, tem sempre na sua base todo um contexto onde nos inserimos, no qual praticamos este desporto e no qual estabelecemos todas as nossas vivências. Pode ter ou não interpretações para outras áreas ou apenas estabelecer “ balizas” temporais , enquadrativas da nossa área.
Hoje e como em todas as sociedades os desafios columbófilos que enfrentamos são de índole diversa daqueles que tínhamos há anos atrás. Não poderia ser de outro modo. Toda a sociedade onde nos inserimos está em constante modificação e alteração e, como tal há necessidade premente de nos adaptarmos e enfrentarmos os novos desafios . É necessário como tal pensar atempadamente e planificar organizacionalmente tudo aquilo que pode e terá repercussões nos anos futuros.
A Columbofilia por muito que nos custe afirmar é um desporto em recessão e com um envelhecimento marcado nos seus praticantes. Esta recessão verifica-se a diversos níveis e em diversos parâmetros.
Tivemos, na minha opinião, três fases bem vincadas nesta prática. Uma primeira pelos anos 60 a 80 do século passado. Uma segunda que se situa na década de 90 do mesmo século e principio do sec XXI e, uma terceira que vem de 2004/ 2005 até aos dias de hoje.
A primeira ( anos 60/ 80) é a fase que denomimo de implantação da columbofilia e do seu enraizamento com o aparecimento de grande número de colectividades que ainda hoje existem. Sei perfeitamente que já antes dos anos 60 esta prática estava a germinar em diversas colectividades ( fase embrionária), ligada muitas vezes a pessoas que dela tinham mais conhecimento e algumas “ elites” no bom sentido que contribuíram decisivamente para essa frutificação dos anos seguintes.
Nesta fase a columbofilia retrata a própria época que vivíamos ( não podia ser de outro modo), reflecte as dificuldades de um país atrasado da Europa desenvolvida ( hoje continuamos no mesmo lugar, ou seja, na cauda deste continente), onde tudo eram dificuldades. Poucos columbófilos, poucos pombos, dificuldades financeiras. Os próprios calendários reflectiam tudo isto. Mas, o enraizamento das colectividades contribue para esta implantação porque se tornam pólos aglutinadores em determinados meios locais, convívio, amizade, troca de conhecimentos etc são basilares nestas estruturas e cimentam a sua afirmação.
A nível de organizações distritais ( comissão, associação) são também estruturas incipientes funcionando quase como carolice ,muitas vezes ,nas casas de alguns dirigentes. Os transportes por caminho de ferro permitem a prática desportiva e mais tarde já com alguma organização compram-se os primeiros carros ( normalmente velhos ) para o transporte de pombos. Tudo eram dificuldades. Poucos pombos , pouco lucro. Pouco lucro origina dificuldades económicas , estamos portanto num ciclo difícil de sair e de ultrapassar. Cito apenas por curiosidade que o distrito a que pertenço tinha na época um carro nestas condições e com uma lotação de 126 caixas. ( a recolha era feita porta a porta e demorava todo o dia anterior ao concurso e até aos anos 90 nunca foi cheio ).
Dos anos 90 até por volta de 2004/2005 entramos naquilo que denomino de “ massificação “ na columbofilia. Temos muitos columbófilos, quase todos tem muito pombos . Há aqui condições objectivas para se dar um salto. É preciso alterar a estrutura física de transporte dos pombos. São necessários mais camions, com mais capacidade de lotação e depois é esperar apenas que os mesmos se encham…
Cito o meu distrito que tivemos, num curto espaço de tempo, de adquirir um camion que levava 196 caixas, um tractor com uma galera com 260 caixas e ainda uma galera disponível com mais 240 caixas ( recorríamos ao aluguer de outro tractor). Se quisermos fazer algumas contas nesta capacidade de caixas tínhamos mais de 20.000 pombos a voar. É certo que isto apenas se verificava nos treinos mas era uma fonte de rendimento muito grande ( quando havia alguma dificuldade financeira bastava aumentar os treinos associativos de 3 para 4 e estava o problema resolvido sem necessidade de fazer aumento no preço do pombo). É também o período em que se consegue comprar uma sede para a Associação ( eu disse comprar).
Aliado a tudo isto não podemos esquecer que o país regista alguns progressos económicos que se reflectem na capacidade financeira dos columbófilos. A informatização chega a este desporto , pranchas electrónicas ( com consequências positivas e negativas) e o fazer das classificações de modo informático que foi uma revolução , da qual tenho algum orgulho em referir porque, este distrito esteve nessa dianteira. ( não foi pessoal porque, eu ainda hoje pouco sei de informática mas, os amigos que estavam comigo na Associação tiveram aqui uma quota bastante elevada porque me mentalizaram que era mesmo para o futuroe era aqui que tínhamos de apostar).
Em suma há um conjunto de condições que se juntaram e contribuem para que este desporto atinja em diversas vertentes altos patamares. É bom também lembrar que o poder local deu enorme ajuda às colectividades e por tabela ás próprias associações.
Todos sabíamos, mas não o queríamos admitir que tudo isto não podia manter-se. O horizonte apresentava nuvens negras e algumas vezes carregadas ( todos conhecíamos o que já se estava a passar na Bélgica e Holanda onde, as reduções de columbófilos eram enormes ) . Na viragem do século ainda nos parece que vamos superar o embate mas … a realidade foi mais forte que a nossa boa vontade. Por volta dos anos de 2004/2005 começamos a sentir uma diminuição no número de praticantes e como tal tudo por acréscimo começa a oscilar. Todo este cenário é o que verificamos nos dias de hoje , é certo, mais negativo.
Diminuímos em columbófilos cerca de 50% nos últimos 7/8 anos. Toda a nossa estrutura tem mesmo de oscilar. Temos a nível demográfico a prevalência de um envelhecimento que já se notava mas que de há anos ( poucos) a esta parte mais se faz sentir. Já temos aqui dois aspectos penalizantes para a columbofilia, se lhe juntarmos os aumentos dos combustíveis verificados há 5/ 6 anos e a crise financeira para a qual nos conduziram , com baixos salários, cortes em pensões , despedimentos etc ,etc tudo isto nos leva a um “coktail “ difícil de gerir e ainda mais de planificar e com consequências ainda imprevisíveis .
Cito mais uma vez o meu distrito e com base em dados da própria Associação, temos na primeira prova de velocidade em 2008 enviados 8.839 pombos. Na primeira prova deste ano de 2015 temos, 6.315. São números para pensar mas, representam uma diminuição de pombos voados ( logo na primeira prova) de 2.524. O que significa uma perda de 28.5%. Estou a referir-me a um distrito denominado dos pequenos mas mesmo nestes casos as perdas são sempre penalizadoras. Sei perfeitamente que há termos de responsabilidade para atenuar e, este ano com a decisão do Congresso Federativo de reduzir o número de pombos por caixa foi ,um modo de se compensarem e atenuarem estes efeitos pois deu um “enorme aumento” no preço dos pombos, sem o sentirmos.
Estamos em situação difícil. Nada vai melhorar nos próximos anos porque a columbofilia não capta novos praticantes. A crise financeira veio, e como dizem todos os analistas económicos para ficar. como tal a columbofilia tem poucas ou nenhuma hipótese de ser uma excepção. Além de que o envelhecimento dos praticantes vai continuar a fazer-se sentir. Temos para complicar uma estrutura física de camions muito pesada e com custos elevados.
O que poderemos corrigir?
Não é um processo nada fácil. É necesssário pessoas com vontade, dinâmicas, trabalhadoras que assumam projectos para o futuro ( sei que as temos ). Além de que é preciso um suporte financeiro, o que nalgumas associações ainda se verifica e até me parece ( posso estar errado) que este processo será mais fácil de encetar nas pequenas associações. Não vejo e penso que seja altamente penalizador qualquer aumento no preço dos pombos ( será o afastar de mais alguns columbófilos).
Há necessidade a curto e médio prazo de alterar a frota de carros. Não precisamos de ter estruturas para um número de caixas que nunca enchemos. Qualquer estrutura parada está condicionada a uma degradação. É necessário também focar a atenção nos próprios camions e ,caminhar para carros mais pequenos, mais baratos, que consumam muito menos combustível, mais rápidos e que não tenham custos de manutenção tão elevados. É toda uma lógica completamente diferente da que vivemos e assistimos na década de noventa porque por mais que queiramos sonhar não regressamos a esse passado.
Por outro lado há necessidade de repensar as próprias caixas de transporte dos pombos. São necessários materiais mais leves, tipo plástico ou alumínio de modo a ser mais fácil o carregamento e o manuseamento das mesmas por esta massa de columbófilos já “pesados” e envelhecidos. Talvez se possam adaptar aos próprios camions estruturas ( monta cargas ou algo semelhante) para ajudar ao carregamento das caixas como já hoje vejo por aí na entrega e descarregamento de mercadorias em certas áreas comerciais.
Foram e são apenas ideias, sempre com uma tónica de construção!
(Publicado no Mundo Columbófilo de 27 Junho 2015 )
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