Nas minhas diversas idas às montarias, tradicionais do Monte Grande em Monforte da beira, tem sido habitual fazer o discurso inicial, bem como a apresentação da montaria, um nonagenário português que esteve ao serviço da Legião estrangeira francesa, condecorado pelo Governo francês com a Cruz de guerra de Operações no Exterior. Num dos seus famosos discursos relatou-nos a sua participação na guerra da Indochina (1946-1954) que opôs a França à Indochina francesa (Camboja, Vietname do Norte, Laos e Vietname do Sul). Nesse dia mesmo a minha formação militar não foi suficiente para passar ao lado da história contada. Comoveu-me ao relatar, com todos os pormenores, que depois de uma emboscada em que perderam mais de 3.000 homens entre mortos e feridos, no outro dia pela manhã o seu comandante mandou erguer um palanque à frente da formatura da Legião, puxou da pistola apontou-a à cabeça proferindo: isto é o que se faz aos incompetentes, premindo o gatilho.

É claro que estamos ainda na época em que os princípios básicos da honra, ética e Deontologia, qualquer que ela seja, eram fundamentais e inquestionáveis.

Hoje adaptámo-nos a uma sociedade desumanizada, sem princípios em que, por vezes, questionamos tudo por se ter perdido no Homem o espírito fundamental. Tornámo-nos excepcionalmente materialistas e sobreviventes de um capitalismo do salve-se quem poder e a qualquer custo.

Vem tudo isto a propósito do modo como a nossa columbofilia tem sido dirigida nos últimos anos: desastres em soltas, em que, à priori, se sabia que a probabilidade de correr mal era enorme, em que o presidente da FPC era informado, 10 a 20 minutos de pois das soltas, de que iria haver desastre, a que se juntou “lixívia”, para as branquear através de almoços e reuniões entre os intervenientes para que tudo fosse ultrapassado (esquecido), sem culpados, com negligência ou não.

Não se verificaram nem uma nem duas mas algumas em que com base num espírito corporativo se sublimou os acontecimentos independentemente dos prejuízos causados aos columbófilos. Cortar a informação ao “povo” manter o poder a qualquer custo, silenciando os acontecimentos para não levantar ondas.

A chefia (FPC), como entidade reguladora do desporto columbófilo Nacional, não pode ter conhecimento, mesmo que pouco provável de uma situação acontecer ou ter acontecido, de desconfianças nas classificações dos pombos de “Sport” e “Standard” sem agir porque a responsabilidade última é sua.

O caso mais recente foi o da última exposição nacional em que foram admitidos para a exposição pombos, ao que parece, sem terem as classificações exigidas. Pergunta: como é que se pode aceitar um pombo para uma exposição nacional sem ter a acompanhar os documentos justificativos das classificações assinados pela associação que representa? O problema não está na falta de documentos. O problema está na incompetência de quem deixou concorrer à exposição nacional pombos sem terem os comprovativos necessários para lá estar, autorizar a sua classificação, fazer a festa e entregar os prémios. O ónus da questão reside nisto e não na hipotética falcatrua. Depois do inquérito, possivelmente, será transmitido ao “povo” que os dirigentes foram enganados. A culpa será sempre dos outros, à boa maneira portuguesa. Eles, os responsáveis, não tiveram culpa nenhuma. Foram simplesmente enganados!

É lamentável tudo o que se passou. Mas apesar disso, não basta lamentar. Quer queiramos quer não existem responsáveis pela aceitação dos pombos em causa para essa exposição. Não estamos em 1954 a pedir que os responsáveis se matem. Mas sim que no mínimo se demitam. Não estejam à espera da “lixívia” para branquear mais uma situação cuja responsabilidade é vossa. A responsabilidade não se delega. Assume-se. O estar à espera que o tempo tudo resolva, como é hábito, não é digno do Homem. A demissão nem sempre é sair pela porta pequena. É por vezes o reconhecimento de que não somos profissionais e de que não podemos estar em todo o lado. O auto consentimento da responsabilidade pelo que se passou, através da demissão trará, porventura, enriquecimento pessoal e organizacional. Um homem que é Homem assume as suas responsabilidades, não espera pela demissão. Demite-se!

Se o presidente tem competência para nomear também tem competência para demitir, caso não o faça terá que assumir a sua responsabilidade, mesmo que essa não se lhe possa atribuir directamente pela culpa na admissão de pombos sem as qualificações, pois não o fazendo estará a ser cúmplice com a situação, contribuindo para o descrédito da nossa columbofilia.